quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Louvados e glorificados sejam os números


Louvados e glorificados sejam os números

Posted: by Mauricio Zágari
in Igreja dos nossos dias

Lembro-me de um episódio de minha infância que me marcou muito. Eu deveria ter cerca de 5 ou 6 anos de idade, quando meus pais me levaram a um evento cuja grande atração era o palhaço Carequinha. Em época pré-Xuxa, Carequinha era top. Fiquei emocionado ao vê-lo fazer suas estripulias. Mas em determinado momento ele me assombrou: aproximou-se de mim, inesperadamente, apertou meu nariz e… dele saiu uma moeda! Uau! Fiquei fascinado! Havia uma moeda em meu nariz e Carequinha a havia tirado, sob os aplausos da plateia. O tempo se passou e, mais velho, um dia descobri que na verdade tinha sido enganado: tudo não passava de uma mutreta. Um truque de mágica. Um engano. Um embuste. Ilusão.

Hoje, nós vivemos na Igreja uma ilusão análoga: a ideia de que números são importantes. Lamento informar, mas sem que se aperceba disso você idolatra números. E quando eu digo “você” me refiro a mim, a você e a toda a Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo. Temos loucura por números. Salivamos por números. Achamos que números são a expressão máxima da bênção de Deus. Queremos quantidade, excesso, transbordamento. Só que – pasme – isso vai na contramão daquilo que Jesus almeja para nós. Não passa de moedinha caindo do nariz.

Nós, cristãos, desenvolvemos um péssimo hábito ao longo dos séculos e, em especial, nos últimos duzentos anos: associar excesso de números e empreitadas bem-sucedidas para o Reino de Deus. Podemos tirar um exemplo claro do universo virtual. Você, cristão, que trafega pelo twitter, facebook, orkut e similares, seja honesto, vive numa corrida desenfreada para ganhar “seguidores”, “followers”, “amigos”. Todo dia quem faz parte dessas comunidades cansa de ver aquelas pessoas que volta e meia postam “me segue que eu te sigo”, “descubra quem você segue e que não te segue” e coisas assim. Pois ter uma legião de pessoas que supostamente leem o que você escreve ou que querem ter o prazer da sua companhia naquele site de relacionamentos te confere o status de popular, de gente que tem o que dizer. De relevância. Ou seja: quanto mais “followers” ou “amigos” você tem, mais cool você é. Só que isso não passa de uma boba ilusão. Moedinha pingando do nariz.

Há cerca de um ano criei uma conta no twitter. De lá pra cá tive o privilégio de ter a companhia de 1.491 followers. Em teoria, são pessoas que me seguem porque lhes interessa o que tenho a dizer. E eu realmente acreditava nisso, até que inaugurei este blog. Eu o criei há 28 dias e nesse período recebi 3.752 visitas, com 8 textos postados. Isso dá uma média de 133 clics por dia ou, o que realmente importa, 468 por post. O único lugar em que anuncio que há novos posts no blog é no twitter. Logo, a conclusão natural é que dos 1.491 followers, apenas 468 se interessam por ler o que eu tenho a dizer. Ou seja, menos de um terço. Essa constatação desfez a ilusão que eu tinha de que 1.491 pessoas se interessam pelo que eu falo.

Ou seja: o número de seguidores que você tem no twitter, no facebook, no orkut ou onde quer que seja não passa de uma moedinha pingada de seu nariz. Não existe uma relação direta entre números e relevância. Não quer dizer que são indivíduos que de fato se interessam pelas suas palavras ou ideias e muito menos por seu valor. Uma pequena parte deles sim. Outra parte apenas te segue para ser seguido (e assim ter a ilusão, por sua vez, de que muitos se interessam por ela). Muitos criaram uma conta, te seguiram e depois nunca mais voltaram. Ou seja: os números das redes sociais são uma tremenda ilusão.

Na vida real

Esse exemplo das redes de relacionamento na verdade são um mero reflexo de valores que nós temos na vida real. E aqui voltamos para a questão da idolatria dos números entre os cristãos. Nós realmente acreditamos que uma igreja cheia, com milhares de membros, é sinal da bênção de Deus. Afinal, se numa igreja local há multidões de pessoas deve significar que o pastor prega demais, as vidas são abençoadas, o louvor é celestial, o Espírito Santo trabalha como nunca. Mas essa não é uma lógica cristã, é uma lógica mundana. É no mundo que pessoas que têm muito dinheiro são sinônimo de sucesso, mesmo que sejam indivíduos sem caráter, ofensivos, pérfidos, intratáveis. É no mundo que ter três carros na garagem, um cartão gold do banco e duas casas de campo fazem de você alguém admirável – seja você o crápula que for. Na Bíblia, isso não quer dizer nada. O Evangelho olha para esses números e diz “são apenas uma moedinha pingada do nariz”.

Mesmo assim, vemos a Igreja exultar porque no culto “tantas pessoas falaram em línguas”, sem nos perguntarmos de que modo Deus foi realmente glorificado por esse fato. “Ah, mas na igreja x caem tantos endemoniados todos os cultos”. Sim, mas… as pessoas libertas daqueles demônios são acompanhadas após esse fato para não abrirem suas almas novamente a eles? “Mas, Mauricio, no culto onde o pastor fulano pregou havia tantas centenas de pessoas em pé na igreja”. Ok, mas quantas saíram efetivamente transformadas daquela pregação? “Você já está me irritando, Mauricio, pois fato é que o programa de televisão do pastor beltrano é transmitido para milhões de pessoas”. Sim, mas quantas dessas abandonam seus pecados por causa disso? “Mauricio, chega! No culto do pastor fulano houve centenas de decisões por Cristo!”. Bem… eu sei que no tal culto centenas de pessoas foram à frente, mas isso não quer dizer que de fato arrependeram-se de seus pecados, foram justificadas pelo Cordeiro e viverão a partir daí em novidade de vida.

Eis aí o xis da questão: números enchem nossa boca, mas sua relevância beira o nada. Pois eles têm o poder de ser tremendamente ilusórios. Fazem-nos crer numa realidade que, na maioria das vezes, é uma irrealidade.

Mas existiria algum mal em valorizar números na Igreja? Bem, o cerne do problema é que a Bíblia mostra que Deus não está preocupado com números. “Entrem pela porta estreita, pois larga é a porta e amplo o caminho que leva à perdição, e são muitos os que entram por ela. Como é estreita a porta, e apertado o caminho que leva à vida! São poucos os que a encontram” (Mt 7.13,14). Que coisa! Que constatação impressionante! Os que entrarão no descanso eterno são poucos. São a minoria! Se o Céu tivesse uma conta no twitter, poderíamos dizer que ele tem muito poucos followers. Lucas 13.23-27 afirma que a página de Jesus no facebook não tem muitos amigos: “Alguém lhe perguntou: ‘Senhor, serão poucos os salvos?’. Ele lhes disse: ‘Esforcem-se para entrar pela porta estreita, porque eu lhes digo que muitos tentarão entrar e não conseguirão. Quando o dono da casa se levantar e fechar a porta, vocês ficarão do lado de fora, batendo e pedindo: ‘Senhor, abre-nos a porta’. ‘Ele, porém, responderá: ‘Não os conheço, nem sei de onde são vocês’. “Então vocês dirão: ‘Comemos e bebemos contigo, e ensinaste em nossas ruas’. “Mas ele responderá: ‘Não os conheço, nem sei de onde são vocês. Afastem-se de mim, todos vocês, que praticam o mal!’.”. Assim, estamos supervalorizando algo que Deus não valoriza.

Ou seja: na matemática do Reino de Deus, números são ilusão. O Céu trabalha com pequenas quantidades e, para mencionar o clichê, para Deus importa a qualidade da fé e sua profundidade, e não a quantidade dos que dizem ter fé. Até porque a parábola do joio e do trigo deixa claro que há em meio às igrejas inchadas muitos que são joio e não representam de fato resultados para a eternidade. Recentemente, conversando com um pastor, ele me disse que acredita que no máximo 30% de sua igreja sejam pessoas que irão para o Céu. Impressionante.

Assim, não importam igrejas lotadas, pois muitos estão ali pelos motivos errados. Não importam cantores gospel que atraem multidões, pois muitos estão ali apenas atrás de uma emoção e não de cultuar de fato Jesus de Nazaré. Não importam muitas “decisões” ao final de uma pregação seguida de um apelo, pois muitos foram à frente ou porque alguém lhes encheu a paciência para que fosse ou porque não entenderam direito a razão exata de ir à frente ou porque foram movidos por uma emoção de momento. Não importa que tantos foram batizados ao longo de um ano na igreja, pois muitos daqueles estarão fora dos caminhos do Senhor seis meses depois por não terem sido discipulados direito. Não importa o orçamento de uma igreja enorme e luxuosa, pois ela pode ter apenas isso, dinheiro e luxo, mas nada de espiritualidade. Não importa uma moeda pingada do nariz, pois ela na verdade caiu da manga do palhaço e não do nariz da criança.

Em Lucas 12.32, o grande pastor Jesus Cristo diz aos seus followers: “Não tenham medo, pequeno rebanho, pois foi do agrado do Pai dar-lhes o Reino”. Repare: pequeno rebanho. O rebanho que herdará o Reino é pequeno. O grupo dos salvos é pequeno. É minoria. Se fosse uma congregação terrena, seria uma daquelas igrejinhas sem vitrais, torres ou palcos com raio laser e som dolby surround. Provavelmente, seria uma daquelas igrejas em que entraríamos e pensaríamos “que igrejinha sem graça, o poder de Deus não deve estar aqui, o pastor não deve pregar bem, o louvor deve ser meio caído, afinal… não tem muita gente”. Essa lógica mundana tem guiado nossas ações para as coisas do Reino. E com isso erramos feio.

Você, que faz parte do pequeno rebanho, esqueça um pouco os números. Tire-os do altar. Lembre-se que Deus salvou no dilúvio um grupo ínfimo de pessoas. Que Israel era uma gota no oceano de povos no mundo. Que Jesus nunca se preocupou com a prosperidade material ou com o saldo no banco. Que aqueles que herdarão a salvação são uma pequena fração daqueles que hoje se dizem cristãos. Dê menos atenção ao apelo e mais ao discipulado. Invista seu tempo em um único novo-convertido, para que ele seja amparado, acompanhado e fortalecido de fato. Fuja de igrejas monstruosas, onde pessoas se tornam apenas… números.

Quando Jesus ressuscitou, uma mulher do pequeno rebanho foi até seu sepulcro. João 20.16 mostra que o Mestre, que tinha sido seguido por tantas multidões, virou-se para ela e lhe chamou pelo nome: “Maria!”. Jesus conhece cada um dos seus pelo nome. É uma vergonha nos preocuparmos mais com números do que com nomes. Jesus não se preocupa com milhões, se preocupa com a unidade, com o indivíduo, com o uno. Massas não lhe interessam. Lhe interessa você, com nome, sobrenome. E, ao contrário dos homens que associam números a resultados, sucesso e bênção, o Mestre nunca te enganará, nunca criará ilusões. Virará para você e dirá: “Tome aqui uma moeda, que vem da minha mão, não sai do teu nariz. Pode ser uma moedinha de pequeno valor, mas eu a entrego diretamente a você, pois te conheço pelo nome, filho amado”.

Paz a todos vocês que estão em Cristo.

Wanderley do Projeto Boas Novas

Nenhum comentário: